GÊNERO ÉPICO OU
NARRATIVO
1 – Ponto de vista ou foco
narrativo: as histórias são contadas a partir do ponto de vista de um narrador,
ser fictício construído a partir das palavras e que, portando, não deve ser
confundido com o autor, “pessoa de carne e osso”.
Há duas formas básicas de se
narrar uma história: em primeira pessoa ou em terceira pessoa.
1.1 – Narração em primeira
pessoa: o narrador pode ser o protagonista ou um personagem secundário da
história. Vejamos o exemplo:
Não, não, a minha memória
não é boa. Ao contrário, é comparável a alguém que tivesse vivido por
hospedarias, sem guardar delas nem caras nem nomes, e somente raras
circunstancias. A quem passe a vida na mesma casa de família, com os seus
eternos móveis e costumes, pessoas e afeições, é que se lhe grava tudo pela
continuidade e repetição. Como eu invejo
os que não esqueceram a cor das primeiras calças que vestiram! Eu não atino com a das que enfiei ontem.
ASSIS, Machado de. Dom
Casmurro
1.2 - Narração em terceira
pessoa: o narrador pode ser onisciente ou observador.
A – Narrador onisciente: conhece tudo sobre os fatos e as
personagens (seus sentimentos, pensamentos e segredos). Vejamos o exemplo:
A meia rua, acudiu à memória de Rubião a farmácia: voltou para trás,
subindo contra o vento, que lhe dava de cara, mas ao fim de vinte passos,
varreu-lhe a ideia da cabeça, adeus farmácia adeus, pouso!
ASSIS, Machado de. Quincas Borba
B – Narrador observador: domina os fatos, mas não “invade” o
interior das personagens, contando apenas suas ações e comportamentos visíveis.
Vejamos o exemplo:
O homem e a moça, na verdade, conversavam
pouco durante aqueles almoços de verão. Depois do café o homem voltava para o
pequeno estúdio nos fundos da casa, e às vezes a moça ia com ele. Ouviam música
e conversavam, e então a moça voltava para a varanda do andar de cima em busca
do sol do meio da tarde.
NEPOMUCENO, Eric. “As três estações”. In Coisas do mundo.
C – Narrador intruso: mesmo não sendo
personagem, não participando da história, "tece" comentários em
primeira pessoa, ou seja, fala com o leitor ou julga diretamente o
comportamento das personagens.
Começo a arrepender-me deste livro. Não que
ele me canse; eu não tenho que fazer; e, realmente, expedir alguns magros
capítulos para esse mundo sempre é tarefa que distrai um pouco da eternidade.
Mas o livro é enfadonho, cheira a sepulcro, traz certa contração cadavérica;
vício grave, e aliás ínfimo, porque o maior defeito deste livro és tu, leitor.
Tu tens pressa de envelhecer, e o livro anda devagar; tu amas a narração direta
e nutrida, o estilo regular e fluente, e este livro e o meu estilo são como os
ébrios, guinam à direita e à esquerda, andam e param, resmungam, urram,
gargalham, ameaçam o céu, escorregam e caem [...]
ASSIS, Machado. Memórias póstumas de Brás Cubas.
Machado de Assis foi
o primeiro autor brasileiro a utilizar sistematicamente este tipo de
narrador.
2 – Personagens: quanto
à postura, ao comportamento, as personagens são classificadas como planas,
redondas ou esféricas, tipos e caricaturais; quanto à
posição ocupada por eles na narrativa, podem ser definidas como protagonistas,
antagonistas e secundárias.
2.1 – Classificação
quanto ao comportamento
A – Personagem plana: não altera o seu
comportamento no decurso da narrativa e, por isso, nenhum ato ou nenhuma reação
de sua parte podem surpreender o leitor.
B – Personagem
redonda ou esférica: apresenta uma complexidade acentuada, múltiplas
características, são enigmáticas e contraditórias. O leitor a percebe como
representação de um ser humano possível de ser encontrado na realidade social.
Geralmente, as personagens centrais das narrativas contemporâneas são redondas.
C – Personagem tipo: representa,
geralmente, um grupo nacional, regional, social, ideológico, etc. A personagem
tipo não sofre transformações, não apresenta mudanças afetivas, psicológicas ou
ideológicas.
D – Personagem
caricatural: é aquela cujas qualificações ou traços são apresentados de
modo exagerado.
2.2 – Classificação
quanto à posição na narrativa
A – Protagonista: é
a personagem principal, em torno da qual se desenvolve o enredo.
B – Antagonista:
é a personagem que se contrapõe à principal.
C – Secundárias:
geralmente, menos importantes, episódicas e acessórias.
2.3 – As
transformações do herói: do épico ao moderno
Ao longo dos séculos, o herói
do poema épico se transformou devido às mudanças sociais e políticas por que
passaram as sociedades humanas. A maior transformação ocorreu quando, no séc.
XVIII, as epopeias deram lugar ao romance.
Escrito em prosa, o
romance também focaliza as aventuras de um herói, sendo este definido
pela força do seu caráter e não mais pelas conquistas pátrias. O herói
moderno é um ser humano comum, que enfrenta uma série de problemas
cotidianos e luta para superá-los, sem qualquer ajuda divina. Essas
características o diferem do herói épico.